quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Fwd: [Crer e Pensar] Estamos lendo Gênesis – e suas afirmações sobre as origens – de forma errada?


Nos últimos anos, John Walton, escritor e professor de Antigo Testamento do Wheaton College, tem sido tão elogiado quanto criticado por sua interpretação de Gênesis 1 e 2.
Sua pesquisa recente tem se concentrado em estudos comparativos entre o Antigo Testamento e escritos do antigo Oriente Próximo, com especial interesse sobre o livro de Gênesis. Walton é um dos convidados internacionais da I Conferência Nacional Cristãos na Ciência, que acontece essa semana (17 a 19) na Universidade Mackenzie, em São Paulo.
Entre os seus vários livros, está O Mundo Perdido de Adão e Eva – o debate sobre a origem da humanidade e a leitura de Gênesis, ganhador do Prêmio Christianity Today Biblical Studies 2016, publicado no Brasil pela Editora Ultimato.

ENTREVISTA | JOHN WALTON

Por Kevin P. Emmert

Ao argumentar que o relato da criação em Gênesis não é sobre origens materiais, você vai contra dois mil anos de interpretação histórica. Isso te faz refletir?
Eu respeito os intérpretes e teólogos do passado. Muitas das minhas ideias podem ser encontradas nos patriarcas da igreja e eu tento trazer algumas delas para a minha pesquisa. Mas, hoje nós também temos informações que a maioria dos intérpretes históricos não tinham, como documentos antigos do Oriente Próximo.

Ao longo da história, teólogos responderam aos desafios de seus tempos. Hoje, nós temos questões diferentes em discussão. Então não é supreendente que eu fale sobre assuntos não abordados por eles. Ainda que minhas conclusões exegéticas sejam diferentes do que muitas pessoas já ouviram, eu não estou questionando nenhuma doutrina básica. Sou essencialmente conservador teologicamente, e firmemente evangélico em minha perspectiva. Eu desejo manter e articular a autoridade das Escrituras.

Ainda assim, eu sinto que essa é uma discussão tão importante que vale a pena sairmos da nossa zona de conforto e tomarmos riscos.

Você interpreta Gênesis de uma maneira que a maioria dos Cristãos não compreende se usarem uma "leitura simples". Como você chegou às suas conclusões?
Eu basicamente olho cuidadosamente para o que a Bíblia afirma. Então eu me pergunto: O que Gênesis realmente diz sobre origens? Nós precisamos ir além de uma leitura casual para descobrir isso. Isso significa que nós precisamos entender a língua hebraica e o mundo antigo do Oriente Próximo. Então, eu analiso profundamente os significados das palavras e frases hebraicas e como os anciãos pensavam sobre origens.

Nós temos vinculado certas coisas que não precisam estar necessariamente vinculadas. Questões como a imagem de Deus, a origem do pecado, o Adão histórico e as origens humanas são importantes. Elas claramente se sobrepõem, mas as pessoas pressupõem que, se você crê em um Adão histórico, por exemplo, você crê em um certo ponto de vista sobre a origem material do homem [uma criação de seis dias literais]. Ou, se você crê no pecado original, você crê em um Adão histórico. O que eu tenho descoberto é que você pode lidar com essas questões individualmente, sem misturá-las. Você pode defender um Adão histórico, mas isso não tem as implicações nas origens biológicas de humanos como muitas vezes se pressupõe.

Por que é importante ler Gênesis à luz do Oriente Próximo Antigo?
A Palavra de Deus foi escrita para nós [para o nosso benefício], mas não destinada [endereçada] a nós. Trazer o texto antigo aos leitores modernos não é apenas atualizar o vocabulário: é necessário compreender a cultura na qual o texto foi escrito. Eu certamente não quero que o contexto do Oriente Próximo Antigo force algo que o texto bíblico não esteja dizendo, mas quando estudo Gênesis, eu pergunto: "Como isso se relaciona ao que encontramos no Oriente Próximo Antigo?".

Por exemplo, será que Gênesis 1 está falando apenas sobre duas pessoas ou sobre pessoas em massa? Se quero saber se Gênesis 1 está falando de dois indivíduos ou de humanos como um todo, leio os relatos do Oriente Próximo Antigo. Claro, eles sempre enfatizam pessoas como um todo. Isto não quer dizer que a Bíblia precisa ser desse jeito, mas, se eu encontro indicações de que a Bíblia está fazendo coisas semelhantes a outros relatos do Oriente Próximo, então isso é revelador.

Nós não nos atrevemos a ignorar documentos do Oriente Próximo Antigo – ou mesmo a ciência. Eles podem nos encorajar a repensar o texto bíblico sem nos coagir a determinadas conclusões. O texto bíblico ainda permanece no comando.

Como que as pessoas do tempo dos escritos de Gênesis se distinguem de nós quanto à forma de pensar sobre origens?
O mundo antigo, inclusive Israel, estava mais interessado em como o mundo era organizado do que em como o mundo foi produzido.

Pense sobre o lugar onde você vive. Você pode falar desse lugar como uma casa ou como um lar. Você pode falar sobre como foi construído, ou sobre como se tornou seu lar, como funciona pra você, como é organizado para a sua família. Tanto uma coisa quanto a outra são importantes, mas são diferentes. Estão inter-relacionadas porque você precisa da casa para ter um lar. Entretanto, os antigos estavam mais interessados na história do lar – como Deus ordenou este mundo para nós.

Eu vejo em Gênesis a história de Deus ordenando o cósmos para funcionar para as pessoas. Ele vai entrar, descansar aqui, habitar aqui e relacionar-se conosco aqui. "Eu irei e prepararei um lugar para vocês", Jesus disse. Essa não foi a primeira vez que Cristo fez isso. Este mundo foi preparado para que nós nos relacionássemos com Deus, "para que também possam estar onde estou" [João 14:3].

No entanto, Gênesis 2 aborda como nós agiremos nesse espaço sagrado em um relacionamento com Deus. Então, o Éden não é apenas um espaço verde, mas também um espaço sagrado. Deus está lá e isso é o que mais importa. Quando Adão e Eva pecaram, eles foram expulsos e perderam acesso à presença de Deus. Era assim que os Israelitas pensavam a respeito e essa questão teológica é muito mais importante do que nossas perguntas sobre origens.

Você está dizendo que as perguntas sobre origens não são importantes?
Não, não estou querendo dizer que não são importantes. Entretanto, essas questões refletem mais nossas formas de pensar do que os pensamentos dos antigos. Questões modernas são importantes, mas nós precisamos reconhecer que algumas vezes elas são diferentes das questões e perspectivas antigas.

De que formas você acredita que os leitores modernos entendem mal o livro de Gênesis?
Somos propensos a dizer, "Essa palavra hebraica significa isso e aquela palavra hebraica significa aquilo". Só que não é tão simples assim. Por exemplo, quando lemos a palavra fazer, tendemos a pensar em atividade material. Porém, se você observar como o verbo em hebreu asah (fazer) é utilizado ao longo das Escrituras hebraicas, perceberá que muitas vezes não se trata de atividade material. Em alguns casos, asah significa "prover" ou "preparar".

Quando lemos sobre Adão sendo colocado em um "sono profundo" e Eva sendo "criada", nós automaticamente pensamos que Adão está sendo anestesiado para cirurgia. Mas, um público antigo não teria pensado dessa forma. A palavra hebraica para "sono profundo" é usada ao longo do Velho Testamento para se referir a uma experiência visionária. Essa é a forma que um leitor israelita teria lido Gênesis 2. Portanto, acredito que esse sono profundo de Adão foi visionário e não uma operação cirúrgica. Em outras palavras, ele vê algo sobre Eva.

Será que a afirmação de que leitores não podem compreender Gênesis propriamente sem saber hebraico e conhecer a cultura do Oriente Próximo Antigo não é só uma forma de elitismo acadêmico?
Não é mais elitismo acadêmico do que reconhecer que alguém tem que traduzir a Bíblia para inglês. Trazer o texto antigo para nós não é só uma questão de atualizar o vocabulário; é uma questão de entender a cultura na qual foi escrito. Nós temos que traduzir não só a língua, mas também a cultura. Nós todos dependemos do conhecimento de outros. Nunca tendo a pensar que o exercício dos dons ou talentos espirituais de alguém seja elitismo. Sou uma mão, não um olho, e outra pessoa é um olho, não uma mão. É assim que o corpo de Cristo funciona.


Eu acredito que Adão foi uma pessoa real, mas, literalmente, ele representa bem mais do que ele mesmo. Ele representa quem somos nós.

O que você quer dizer quando afirma que Adão serve como um arquétipo para a humanidade?
Às vezes confundimos arquétipo com protótipo. Um protótipo é o primeiro de uma linhagem, um modelo para os outros, mas um arquétipo é mais que isso. Ele incorpora e representa algo ou alguém. Então, quando Paulo fala sobre todos nós pecando em Adão, ele está falando sobre Adão como um arquétipo e, claro, Cristo é um arquétipo também [como o Segundo Adão].

Assim, tratar Adão como um arquétipo é explicar como ele tem sido abordado na literatura bíblica. Não é uma análise sobre o fato de ele ter sido uma pessoa real ou não. Eu acredito que Adão foi uma pessoa real, mas, literalmente,ele representa bem mais do que sua própria pessoa. Ele representa todos nós. Genêsis fala mais sobre humanidade e quem nós somos por causa desse indivíduo. Paulo faz a mesma coisa com Adão, então eu acho que estou bem acompanhado.

A igreja histórica afirma que Adão representava a humanidade, que todos nós pecamos com ele (Rom. 5:12). Como, então, a sua perspectiva difere da visão tradicional?

A visão tradicional fala sobre Adão arquetipicamente em relação ao pecado, o que eu concordo. Porém, acredito que Adão também está sendo usado de forma arquetípica com relação às origens humanas. Isto é: quando o texto diz que Adão foi formado do pó da terra, não quer dizer que aquele indivíduo foi formado de pó, e o resto de nós nasceram de mulher. Está dizendo que todos nós somos pó; isso é que é humanidade – adão, hebraico para "humanidade". Nós somos mortais, nós somos frágeis, somos terrenos, somos pó. Não se trata de uma afirmação única sobre Adão; é verdade sobre todos nós.

Você sugere que a declaração de Deus sobre a criação, "bom" e "muito bom" não significa "perfeito". Diz também que Adão e Eva foram criados mortais. Como, então, devemos compreender Romanos 5, quando Paulo sugere que não havia morte antes de Adão?
Quando Paulo foca no porquê os humanos são sujeitos à morte, ele não está preocupado com a morte a nível celular, mas sobre porque somos sujeitos a ela. A resposta é o pecado. Isso não é o mesmo que dizer que Adão foi criado imortal. Geralmente, chegamos a essa conclusão precipitada, mas não faria sentido pessoas imortais terem uma Árvore da Vida. Para mim, isso indica que as pessoas foram criadas mortais e receberam uma remediação para sua condição [comer do fruto da Árvore da Vida], mas quando Adão e Eva pecaram, nós perdemos acesso a isso e por isso somos sujeitos à morte.

Isso significa que havia morte antes de Adão e Eva?Eu penso que sim. O fato de Deus ter criado uma Árvore da Vida sugere que havia morte antes de Adão e Eva. O pecado é a razão de termos perdido acesso a essa remediação e sermos, portanto, sujeitos à morte. Não é que a morte veio a existir quando Adão e Eva pecaram. Eu não sei nem se podemos falar sobre a morte "existir". E não é que animais, plantas e células não experimentassem a morte. A morte em um nível celular é necessária para o desenvolvimento. Para aqueles que estão dispostos a aceitar teorias evolucionistas, a morte anterior à Queda não é um problema. Embora Paulo não esteja abordando as nossas preocupações e problemas modernos, ele não está afirmando algo que os descarta.

Além disso, quando Deus disse, "mas da árvore do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás" [Gênesis 2:17], Ele não quis dizer que eles morreriam dentro de um período de 24 horas. Em hebraico, a expressão "no dia" é uma expressão idiomática para "quando", e a expressão que é traduzida como "certamente morrerás" poderia ser melhor traduzida como "você estará destinado a morrer, condenado à morte" e é importante fazer essa distinção.

Se Gênesis 1 fala sobre humanidade coletiva, sobre quem fala Gênesis 2?
Gênesis 2 foca em dois indivíduos. Não há razão para que eles não estivessem entre o grupo original mencionado em Gênesis 1, mas Gênesis 2 foca apenas nesses dois indivíduos, pois eles serão representantes no espaço sagrado. É dada a eles a tarefa de servir e cuidar – que são obrigações sacerdotais – do Jardim. Eles são escolhidos como representantes sacerdotais. Novamente, isso é uma questão teológica, não uma questão sobre origens científicas. Esse é outro exemplo de como precisamos desvincular coisas que foram colocadas juntas desnecessariamente.

Esses foram os dois únicos indivíduos que tiveram acesso à Árvore da Vida?
Sim, eles receberam permissão para entrar no espaço sagrado como representantes, assim como os sacerdotes servem no espaço sagrado. Não era qualquer pessoa que podia vagar pelo templo. Sacerdotes servem no espaço sagrado e representam as pessoas ali. O papel de um sacerdote não está limitado a praticar rituais. Sacerdotes têm acesso à presença de Deus e mediam a revelação. É isso que eu acredito que Adão e Eva fizeram.

Você afirma que apesar de os primeiros humanos serem inocentes, eles não eram necessariamente sem pecado. O que você quer dizer? Eles erravam moralmente antes de comerem do fruto da Árvore do Conhecimento?A distinção entre inocência e ausência de pecado ou pecaminosidade é importante, e Paulo a faz. Ele diz em Romanos 5, "pois antes de ser dada a lei, o pecado já estava no mundo. Mas o pecado não é levado em conta quando não existe lei". Nesse contexto, o pecado não é tanto uma questão de comportamento, mas sim de ser responsabilizado por certo comportamento. Quando eu digo que os primeiros humanos eram inocentes, estou dizendo basicamente que ainda não eram responsabilizados pelo que faziam. Esse modo de pensar não é desconhecido em discussões teológicas. Nós falamos sobre uma idade de inocência para bebês e crianças. Isso não quer dizer que bebês ou crianças não errem moralmente, mas sim que não estão sendo responsabilizados por cometerem esses erros.

Em relação aos primeiros humanos, a questão é, a partir de que ponto Deus os responsabiliza? Eu penso que isso ocorre no Jardim, quando Ele diz para não comerem do fruto da Árvore do Conhecimento. Se nós pensarmos na Lei da mesma forma que Paulo, então chegar a essa conclusão é razoável.

Então, a Árvore do Conhecimento funcionou como uma lei?
Eu acredito que aquela árvore represente sabedoria e sabedoria nunca é obtida imediatamente. É necessário aprendê-la e obtê-la gradualmente por experiência, através de um relacionamento de mentoria. A Bíblia o faz muito claramente e era isso que Deus queria para os primeiros humanos – que estavam em processo, assim como o resto da criação.

Sabedoria e vida vêm de Deus. Se ele colocar árvores frutíferas para mediar isso, tudo bem: Ele pode fazer isso. Afinal, Ele fez do cabelo de Sansão o mediador para sua força. Mas não vamos perder o foco: sabedoria e vida vêm de Deus e estas não podem ser roubadas dele; são dadas por Ele.

Se os humanos podiam errar moralmente antes de serem responsabilizados, como que Deus não pode ser culpado pelo pecado?
Teologicamente nós dizemos, "Deus não é o autor do pecado". Pecado é uma escolha feita contra Deus. Se Deus dá escolha às pessoas e elas escolhem contra Ele, então elas estão na posição de serem responsáveis por isso. Não é que Deus tenha criado o pecado. Ao contrário, Deus criou a possibilidade de as pessoas fazerem uma escolha diferente daquela que Ele planejou.


Quando tentamos descobrir como Adão e Eva se encaixam em teorias científicas, nós obtemos poucas informações da Bíblia e da ciência.



Quais as implicações que a sua leitura de Gênesis 1-3 tem para nosso entendimento científico moderno das origens?
A visão que eu ofereço é que a Bíblia não faz afirmações que são necessariamente incompatíveis com a ciência. Eu não vejo um abismo entre a Bíblia e a ciência que impede as pessoas de crerem ou que as leva para longe da fé. Isso não significa que tenhamos resolvido tudo, mas nós, às vezes, fazemos a Bíblia dizer coisas que ela não diz com relação a origens humanas biológicas. Quando nós descobrimos o que a Bíblia diz e o que ela não diz, isso ajuda a guiar nossa abordagem para refletirmos sobre ciência. Se eu acredito que a Bíblia exclui uma teoria científica específica, então isso molda minha forma de pensar. Se eu sinto que a Bíblia não aborda uma teoria específica, eu me sinto, portanto, livre para examinar a ciência e ver se parece plausível ou não.

Na sua opinião, a Bíblia exclui a teoria da evolução?
Eu não acredito que a Bíblia faça afirmações que contradizem de forma inerente um modelo evolucionário ou de ancestral comum. Porém, isso não significa que eu, por consequência, aceite essas teorias. Quero dizer: eu não acredito que a Bíblia interferiria em alguém que considerasse essas teorias convincentes.

Quanto à integração da Bíblia com a ciência, deparamo-nos com um grande problema, pois a Bíblia não aborda questões como o desenvolvimento do Homo sapiens, a revolução neolítica, ou o efeito de gargalo. E a ciência não tem como responder quem foram Adão e Eva ou onde eles se encaixam nas teorias científicas dominantes.
Como resultado, quando tentamos descobrir como Adão e Eva se encaixam em teorias científicas, nós obtemos pouca informação sobre a Bíblia e a Ciência e isso leva-me a ser mais cuidadoso. Algumas pessoas se sentem confortáveis tentando colocar Adão e Eva em um cenário ou noutro. Sou mais cuidadoso porque nem a ciência, nem a Bíblia abordam isso. Sinto que há coisas que eu não preciso saber.

Como contamos a história de Gênesis 1-3 para os não-cristãos ou as crianças?
Eu simplesmente diria que Deus fez um lar para nós, um lar que nos dá o que precisamos, um lar onde Ele pode estar e se relacionar conosco. Eu diria que os humanos foram feitos à imagem de Deus, mas que Ele também nos fez frágeis e por isso dependemos dele. Ele nos criou para sermos homem e mulher, da maneira como é a humanidade. Deus fez todas essas coisas maravilhosas. Essa é a fundação, a base. Quando as pessoas começarem a levantar questões científicas, lidarei com elas à medida em que elas forem aparecendo.

Tradução: Maisa Haddad
Revisão: Mariane Shen Yin Lin

Entrevista publicada originalmente pela revista Christianity Today, Vol. 59, n. 2. (Março, 2015). Publicada e autorizada no Brasil por Cristianismo Hoje.

fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/estamos-lendo-genesis-e-suas-afirmacoes-sobre-as-origens-de-forma-errada?utm_source=akna&utm_medium=email&utm_campaign=Newsletter+%DAltimas+322+-+22%2F11%2F2016

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Postado no Crer e Pensar em 12/12/2016

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Estamos lendo Gênesis – e suas afirmações sobre as origens – de forma errada?

Nos últimos anos, John Walton, escritor e professor de Antigo Testamento do Wheaton College, tem sido tão elogiado quanto criticado por sua interpretação de Gênesis 1 e 2.
Sua pesquisa recente tem se concentrado em estudos comparativos entre o Antigo Testamento e escritos do antigo Oriente Próximo, com especial interesse sobre o livro de Gênesis. Walton é um dos convidados internacionais da I Conferência Nacional Cristãos na Ciência, que acontece essa semana (17 a 19) na Universidade Mackenzie, em São Paulo.
Entre os seus vários livros, está O Mundo Perdido de Adão e Eva – o debate sobre a origem da humanidade e a leitura de Gênesis, ganhador do Prêmio Christianity Today Biblical Studies 2016, publicado no Brasil pela Editora Ultimato.

ENTREVISTA | JOHN WALTON

Por Kevin P. Emmert

Ao argumentar que o relato da criação em Gênesis não é sobre origens materiais, você vai contra dois mil anos de interpretação histórica. Isso te faz refletir?
Eu respeito os intérpretes e teólogos do passado. Muitas das minhas ideias podem ser encontradas nos patriarcas da igreja e eu tento trazer algumas delas para a minha pesquisa. Mas, hoje nós também temos informações que a maioria dos intérpretes históricos não tinham, como documentos antigos do Oriente Próximo.

Ao longo da história, teólogos responderam aos desafios de seus tempos. Hoje, nós temos questões diferentes em discussão. Então não é supreendente que eu fale sobre assuntos não abordados por eles. Ainda que minhas conclusões exegéticas sejam diferentes do que muitas pessoas já ouviram, eu não estou questionando nenhuma doutrina básica. Sou essencialmente conservador teologicamente, e firmemente evangélico em minha perspectiva. Eu desejo manter e articular a autoridade das Escrituras.

Ainda assim, eu sinto que essa é uma discussão tão importante que vale a pena sairmos da nossa zona de conforto e tomarmos riscos.

Você interpreta Gênesis de uma maneira que a maioria dos Cristãos não compreende se usarem uma “leitura simples”. Como você chegou às suas conclusões?
Eu basicamente olho cuidadosamente para o que a Bíblia afirma. Então eu me pergunto: O que Gênesis realmente diz sobre origens? Nós precisamos ir além de uma leitura casual para descobrir isso. Isso significa que nós precisamos entender a língua hebraica e o mundo antigo do Oriente Próximo. Então, eu analiso profundamente os significados das palavras e frases hebraicas e como os anciãos pensavam sobre origens.

Nós temos vinculado certas coisas que não precisam estar necessariamente vinculadas. Questões como a imagem de Deus, a origem do pecado, o Adão histórico e as origens humanas são importantes. Elas claramente se sobrepõem, mas as pessoas pressupõem que, se você crê em um Adão histórico, por exemplo, você crê em um certo ponto de vista sobre a origem material do homem [uma criação de seis dias literais]. Ou, se você crê no pecado original, você crê em um Adão histórico. O que eu tenho descoberto é que você pode lidar com essas questões individualmente, sem misturá-las. Você pode defender um Adão histórico, mas isso não tem as implicações nas origens biológicas de humanos como muitas vezes se pressupõe.

Por que é importante ler Gênesis à luz do Oriente Próximo Antigo?
A Palavra de Deus foi escrita para nós [para o nosso benefício], mas não destinada [endereçada] a nós. Trazer o texto antigo aos leitores modernos não é apenas atualizar o vocabulário: é necessário compreender a cultura na qual o texto foi escrito. Eu certamente não quero que o contexto do Oriente Próximo Antigo force algo que o texto bíblico não esteja dizendo, mas quando estudo Gênesis, eu pergunto: “Como isso se relaciona ao que encontramos no Oriente Próximo Antigo?”.

Por exemplo, será que Gênesis 1 está falando apenas sobre duas pessoas ou sobre pessoas em massa? Se quero saber se Gênesis 1 está falando de dois indivíduos ou de humanos como um todo, leio os relatos do Oriente Próximo Antigo. Claro, eles sempre enfatizam pessoas como um todo. Isto não quer dizer que a Bíblia precisa ser desse jeito, mas, se eu encontro indicações de que a Bíblia está fazendo coisas semelhantes a outros relatos do Oriente Próximo, então isso é revelador.

Nós não nos atrevemos a ignorar documentos do Oriente Próximo Antigo – ou mesmo a ciência. Eles podem nos encorajar a repensar o texto bíblico sem nos coagir a determinadas conclusões. O texto bíblico ainda permanece no comando.

Como que as pessoas do tempo dos escritos de Gênesis se distinguem de nós quanto à forma de pensar sobre origens?
O mundo antigo, inclusive Israel, estava mais interessado em como o mundo era organizado do que em como o mundo foi produzido.

Pense sobre o lugar onde você vive. Você pode falar desse lugar como uma casa ou como um lar. Você pode falar sobre como foi construído, ou sobre como se tornou seu lar, como funciona pra você, como é organizado para a sua família. Tanto uma coisa quanto a outra são importantes, mas são diferentes. Estão inter-relacionadas porque você precisa da casa para ter um lar. Entretanto, os antigos estavam mais interessados na história do lar – como Deus ordenou este mundo para nós.

Eu vejo em Gênesis a história de Deus ordenando o cósmos para funcionar para as pessoas. Ele vai entrar, descansar aqui, habitar aqui e relacionar-se conosco aqui. “Eu irei e prepararei um lugar para vocês”, Jesus disse. Essa não foi a primeira vez que Cristo fez isso. Este mundo foi preparado para que nós nos relacionássemos com Deus, “para que também possam estar onde estou” [João 14:3].

No entanto, Gênesis 2 aborda como nós agiremos nesse espaço sagrado em um relacionamento com Deus. Então, o Éden não é apenas um espaço verde, mas também um espaço sagrado. Deus está lá e isso é o que mais importa. Quando Adão e Eva pecaram, eles foram expulsos e perderam acesso à presença de Deus. Era assim que os Israelitas pensavam a respeito e essa questão teológica é muito mais importante do que nossas perguntas sobre origens.

Você está dizendo que as perguntas sobre origens não são importantes?
Não, não estou querendo dizer que não são importantes. Entretanto, essas questões refletem mais nossas formas de pensar do que os pensamentos dos antigos. Questões modernas são importantes, mas nós precisamos reconhecer que algumas vezes elas são diferentes das questões e perspectivas antigas.

De que formas você acredita que os leitores modernos entendem mal o livro de Gênesis?
Somos propensos a dizer, “Essa palavra hebraica significa isso e aquela palavra hebraica significa aquilo”. Só que não é tão simples assim. Por exemplo, quando lemos a palavra fazer, tendemos a pensar em atividade material. Porém, se você observar como o verbo em hebreu asah (fazer) é utilizado ao longo das Escrituras hebraicas, perceberá que muitas vezes não se trata de atividade material. Em alguns casos, asah significa “prover” ou “preparar”.

Quando lemos sobre Adão sendo colocado em um “sono profundo” e Eva sendo “criada”, nós automaticamente pensamos que Adão está sendo anestesiado para cirurgia. Mas, um público antigo não teria pensado dessa forma. A palavra hebraica para “sono profundo” é usada ao longo do Velho Testamento para se referir a uma experiência visionária. Essa é a forma que um leitor israelita teria lido Gênesis 2. Portanto, acredito que esse sono profundo de Adão foi visionário e não uma operação cirúrgica. Em outras palavras, ele vê algo sobre Eva.

Será que a afirmação de que leitores não podem compreender Gênesis propriamente sem saber hebraico e conhecer a cultura do Oriente Próximo Antigo não é só uma forma de elitismo acadêmico?
Não é mais elitismo acadêmico do que reconhecer que alguém tem que traduzir a Bíblia para inglês. Trazer o texto antigo para nós não é só uma questão de atualizar o vocabulário; é uma questão de entender a cultura na qual foi escrito. Nós temos que traduzir não só a língua, mas também a cultura. Nós todos dependemos do conhecimento de outros. Nunca tendo a pensar que o exercício dos dons ou talentos espirituais de alguém seja elitismo. Sou uma mão, não um olho, e outra pessoa é um olho, não uma mão. É assim que o corpo de Cristo funciona.


Eu acredito que Adão foi uma pessoa real, mas, literalmente, ele representa bem mais do que ele mesmo. Ele representa quem somos nós.

O que você quer dizer quando afirma que Adão serve como um arquétipo para a humanidade?
Às vezes confundimos arquétipo com protótipo. Um protótipo é o primeiro de uma linhagem, um modelo para os outros, mas um arquétipo é mais que isso. Ele incorpora e representa algo ou alguém. Então, quando Paulo fala sobre todos nós pecando em Adão, ele está falando sobre Adão como um arquétipo e, claro, Cristo é um arquétipo também [como o Segundo Adão].

Assim, tratar Adão como um arquétipo é explicar como ele tem sido abordado na literatura bíblica. Não é uma análise sobre o fato de ele ter sido uma pessoa real ou não. Eu acredito que Adão foi uma pessoa real, mas, literalmente,ele representa bem mais do que sua própria pessoa. Ele representa todos nós. Genêsis fala mais sobre humanidade e quem nós somos por causa desse indivíduo. Paulo faz a mesma coisa com Adão, então eu acho que estou bem acompanhado.

A igreja histórica afirma que Adão representava a humanidade, que todos nós pecamos com ele (Rom. 5:12). Como, então, a sua perspectiva difere da visão tradicional?

A visão tradicional fala sobre Adão arquetipicamente em relação ao pecado, o que eu concordo. Porém, acredito que Adão também está sendo usado de forma arquetípica com relação às origens humanas. Isto é: quando o texto diz que Adão foi formado do pó da terra, não quer dizer que aquele indivíduo foi formado de pó, e o resto de nós nasceram de mulher. Está dizendo que todos nós somos pó; isso é que é humanidade – adão, hebraico para “humanidade”. Nós somos mortais, nós somos frágeis, somos terrenos, somos pó. Não se trata de uma afirmação única sobre Adão; é verdade sobre todos nós.

Você sugere que a declaração de Deus sobre a criação, “bom” e “muito bom” não significa “perfeito”. Diz também que Adão e Eva foram criados mortais. Como, então, devemos compreender Romanos 5, quando Paulo sugere que não havia morte antes de Adão?
Quando Paulo foca no porquê os humanos são sujeitos à morte, ele não está preocupado com a morte a nível celular, mas sobre porque somos sujeitos a ela. A resposta é o pecado. Isso não é o mesmo que dizer que Adão foi criado imortal. Geralmente, chegamos a essa conclusão precipitada, mas não faria sentido pessoas imortais terem uma Árvore da Vida. Para mim, isso indica que as pessoas foram criadas mortais e receberam uma remediação para sua condição [comer do fruto da Árvore da Vida], mas quando Adão e Eva pecaram, nós perdemos acesso a isso e por isso somos sujeitos à morte.

Isso significa que havia morte antes de Adão e Eva?Eu penso que sim. O fato de Deus ter criado uma Árvore da Vida sugere que havia morte antes de Adão e Eva. O pecado é a razão de termos perdido acesso a essa remediação e sermos, portanto, sujeitos à morte. Não é que a morte veio a existir quando Adão e Eva pecaram. Eu não sei nem se podemos falar sobre a morte “existir”. E não é que animais, plantas e células não experimentassem a morte. A morte em um nível celular é necessária para o desenvolvimento. Para aqueles que estão dispostos a aceitar teorias evolucionistas, a morte anterior à Queda não é um problema. Embora Paulo não esteja abordando as nossas preocupações e problemas modernos, ele não está afirmando algo que os descarta.

Além disso, quando Deus disse, “mas da árvore do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás” [Gênesis 2:17], Ele não quis dizer que eles morreriam dentro de um período de 24 horas. Em hebraico, a expressão “no dia” é uma expressão idiomática para “quando”, e a expressão que é traduzida como “certamente morrerás” poderia ser melhor traduzida como “você estará destinado a morrer, condenado à morte” e é importante fazer essa distinção.

Se Gênesis 1 fala sobre humanidade coletiva, sobre quem fala Gênesis 2?
Gênesis 2 foca em dois indivíduos. Não há razão para que eles não estivessem entre o grupo original mencionado em Gênesis 1, mas Gênesis 2 foca apenas nesses dois indivíduos, pois eles serão representantes no espaço sagrado. É dada a eles a tarefa de servir e cuidar – que são obrigações sacerdotais – do Jardim. Eles são escolhidos como representantes sacerdotais. Novamente, isso é uma questão teológica, não uma questão sobre origens científicas. Esse é outro exemplo de como precisamos desvincular coisas que foram colocadas juntas desnecessariamente.

Esses foram os dois únicos indivíduos que tiveram acesso à Árvore da Vida?
Sim, eles receberam permissão para entrar no espaço sagrado como representantes, assim como os sacerdotes servem no espaço sagrado. Não era qualquer pessoa que podia vagar pelo templo. Sacerdotes servem no espaço sagrado e representam as pessoas ali. O papel de um sacerdote não está limitado a praticar rituais. Sacerdotes têm acesso à presença de Deus e mediam a revelação. É isso que eu acredito que Adão e Eva fizeram.

Você afirma que apesar de os primeiros humanos serem inocentes, eles não eram necessariamente sem pecado. O que você quer dizer? Eles erravam moralmente antes de comerem do fruto da Árvore do Conhecimento?A distinção entre inocência e ausência de pecado ou pecaminosidade é importante, e Paulo a faz. Ele diz em Romanos 5, “pois antes de ser dada a lei, o pecado já estava no mundo. Mas o pecado não é levado em conta quando não existe lei”. Nesse contexto, o pecado não é tanto uma questão de comportamento, mas sim de ser responsabilizado por certo comportamento. Quando eu digo que os primeiros humanos eram inocentes, estou dizendo basicamente que ainda não eram responsabilizados pelo que faziam. Esse modo de pensar não é desconhecido em discussões teológicas. Nós falamos sobre uma idade de inocência para bebês e crianças. Isso não quer dizer que bebês ou crianças não errem moralmente, mas sim que não estão sendo responsabilizados por cometerem esses erros.

Em relação aos primeiros humanos, a questão é, a partir de que ponto Deus os responsabiliza? Eu penso que isso ocorre no Jardim, quando Ele diz para não comerem do fruto da Árvore do Conhecimento. Se nós pensarmos na Lei da mesma forma que Paulo, então chegar a essa conclusão é razoável.

Então, a Árvore do Conhecimento funcionou como uma lei?
Eu acredito que aquela árvore represente sabedoria e sabedoria nunca é obtida imediatamente. É necessário aprendê-la e obtê-la gradualmente por experiência, através de um relacionamento de mentoria. A Bíblia o faz muito claramente e era isso que Deus queria para os primeiros humanos – que estavam em processo, assim como o resto da criação.

Sabedoria e vida vêm de Deus. Se ele colocar árvores frutíferas para mediar isso, tudo bem: Ele pode fazer isso. Afinal, Ele fez do cabelo de Sansão o mediador para sua força. Mas não vamos perder o foco: sabedoria e vida vêm de Deus e estas não podem ser roubadas dele; são dadas por Ele.

Se os humanos podiam errar moralmente antes de serem responsabilizados, como que Deus não pode ser culpado pelo pecado?
Teologicamente nós dizemos, “Deus não é o autor do pecado”. Pecado é uma escolha feita contra Deus. Se Deus dá escolha às pessoas e elas escolhem contra Ele, então elas estão na posição de serem responsáveis por isso. Não é que Deus tenha criado o pecado. Ao contrário, Deus criou a possibilidade de as pessoas fazerem uma escolha diferente daquela que Ele planejou.


Quando tentamos descobrir como Adão e Eva se encaixam em teorias científicas, nós obtemos poucas informações da Bíblia e da ciência.



Quais as implicações que a sua leitura de Gênesis 1-3 tem para nosso entendimento científico moderno das origens?
A visão que eu ofereço é que a Bíblia não faz afirmações que são necessariamente incompatíveis com a ciência. Eu não vejo um abismo entre a Bíblia e a ciência que impede as pessoas de crerem ou que as leva para longe da fé. Isso não significa que tenhamos resolvido tudo, mas nós, às vezes, fazemos a Bíblia dizer coisas que ela não diz com relação a origens humanas biológicas. Quando nós descobrimos o que a Bíblia diz e o que ela não diz, isso ajuda a guiar nossa abordagem para refletirmos sobre ciência. Se eu acredito que a Bíblia exclui uma teoria científica específica, então isso molda minha forma de pensar. Se eu sinto que a Bíblia não aborda uma teoria específica, eu me sinto, portanto, livre para examinar a ciência e ver se parece plausível ou não.

Na sua opinião, a Bíblia exclui a teoria da evolução?
Eu não acredito que a Bíblia faça afirmações que contradizem de forma inerente um modelo evolucionário ou de ancestral comum. Porém, isso não significa que eu, por consequência, aceite essas teorias. Quero dizer: eu não acredito que a Bíblia interferiria em alguém que considerasse essas teorias convincentes.

Quanto à integração da Bíblia com a ciência, deparamo-nos com um grande problema, pois a Bíblia não aborda questões como o desenvolvimento do Homo sapiens, a revolução neolítica, ou o efeito de gargalo. E a ciência não tem como responder quem foram Adão e Eva ou onde eles se encaixam nas teorias científicas dominantes.
Como resultado, quando tentamos descobrir como Adão e Eva se encaixam em teorias científicas, nós obtemos pouca informação sobre a Bíblia e a Ciência e isso leva-me a ser mais cuidadoso. Algumas pessoas se sentem confortáveis tentando colocar Adão e Eva em um cenário ou noutro. Sou mais cuidadoso porque nem a ciência, nem a Bíblia abordam isso. Sinto que há coisas que eu não preciso saber.

Como contamos a história de Gênesis 1-3 para os não-cristãos ou as crianças?
Eu simplesmente diria que Deus fez um lar para nós, um lar que nos dá o que precisamos, um lar onde Ele pode estar e se relacionar conosco. Eu diria que os humanos foram feitos à imagem de Deus, mas que Ele também nos fez frágeis e por isso dependemos dele. Ele nos criou para sermos homem e mulher, da maneira como é a humanidade. Deus fez todas essas coisas maravilhosas. Essa é a fundação, a base. Quando as pessoas começarem a levantar questões científicas, lidarei com elas à medida em que elas forem aparecendo.

Tradução: Maisa Haddad
Revisão: Mariane Shen Yin Lin

Entrevista publicada originalmente pela revista Christianity Today, Vol. 59, n. 2. (Março, 2015). Publicada e autorizada no Brasil por Cristianismo Hoje.

fonte: http://www.ultimato.com.br/conteudo/estamos-lendo-genesis-e-suas-afirmacoes-sobre-as-origens-de-forma-errada?utm_source=akna&utm_medium=email&utm_campaign=Newsletter+%DAltimas+322+-+22%2F11%2F2016

terça-feira, 18 de outubro de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Disforia de Gênero - posicionamento Christian Medical Fellowship (Reino Unido)

Changing views of transsexuality are making waves in popular culture, politics and medicine. This File examines these developments from a Christian and scientific perspective and will be of interest to health professionals, pastors, churches, organisations and families relating to people with gender dysphoria (previously gender identity disorder). It updates a previous CMF File. (1) 

Bruce Jenner, American Olympic gold medal-winning decathlete, made headline news in 2015 when he publicly announced his transition to a female, Caitlyn Jenner. In 2016, nominations for BAFTA awards included The Danish Girl, a film loosely based on the life of Einar Wegener, a Dutch painter in the 1920s who transitioned to Lili Elbe and became one of the first to undergo reassignment surgery, from the complications of which she tragically died.

Transgender people - those who identify with a different gender to the one assigned to them at birth - were first given legal recognition in their new gender under the terms of the UK Gender Recognition Act 2004. (2) To acquire Gender Recognition Certificates they had to have been medically diagnosed with significant dysphoria (discomfort or distress as a result of a mismatch between their biological sex and gender identity (3)) and to have lived successfully for at least two years whilst presenting themselves in their acquired gender.

The Equality Act 2010 (4) made it unlawful to discriminate against transgender people and the Marriage (Same Sex Couples) Act 2013 (5) made it possible for an opposite-sex marriage to continue following one partner's gender transition, given the agreement of the other. 

A recent parliamentary committee report called for a move away from viewing transgender identity as a disease or disorder of the mind, and replacement of the present medicalised process with a simplified administrative procedure based on selfdeclaration by the individual applicant, free of intrusion by medical and legal personnel. The same report proposed that 16- and 17- year-olds should be eligible to apply for gender recognition, that children should be able to use puberty-blockers and cross-sex hormones earlier, and that Government should move towards 'non-gendering' official records. (6)

Changes in the law reflect changes in public attitudes and culture and have their counterparts in professional guidelines. The US Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fourth Edition (DSM-4, 1994) referred to cross-gender identification as 'Gender Identity Disorder'. (7) In the Fifth Edition (DSM-5, 2013) (8) the same phenomenon is described as 'Gender Dysphoria', shifting the emphasis from gender incongruence as a disorder to the distress (dysphoria) associated with the experience of that incongruence: 'It is important to note that gender nonconformity is not in itself a mental disorder. The critical element of gender dysphoria is the presence of clinically significant distress associated with the condition'. (9)

This change appears to have been ideologically driven, the aim being to de-pathologise gender incongruence. A minority of psychologists and psychiatrists dispute the reclassification, preferring to see gender identity disorder as a body image disorder whereby a person may have an unshakeable conviction that they are one gender when in fact they are the other.
The General Medical Council (GMC) has produced guidance for doctors treating transgender patients (10) and the Royal College of Psychiatrists published its 'UK Good Practice Guidelines' in 2013. (11)




Postado no Bioética e Fé Cristã em 10/18/2016

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Ateus contra o aborto

Comentários ao texto do geneticista Eli Vieira, a favor da descriminalização do aborto.
Recentemente, no site do geneticista Eli Vieira, deparei-me com um texto, com 10 argumentos a favor da descriminalização do aborto até a 12º semana de vida, em apoio ao Conselho Federal de Medicina, que divulgou nota em prol do aborto legal. O texto é interessante, pois enumera muitos dos argumentos utilizados pelos que defendem a descriminalização do aborto. Tomei a liberdade de refutá-los. Abaixo segue o texto original, em letras pretas, e meus comentários, em azul.

Pela defesa da vida através da descriminalização do aborto: uma nota de apoio ao CFM

1 – A questão sobre o aborto não diz respeito à "vida", mas à "vida humana", ou seja, ao indivíduo. Não é uma questão de saber como começa a vida, é uma questão de saber em que etapa do desenvolvimento o nosso Estado laico deve aceitar um embrião como um cidadão digno de direitos.
No primeiro parágrafo o autor já admite falar de vida humana. Afinal, se um zigoto, um embrião ou um feto estão vivos, de que tipo de vida se trata, que não a humana?  Quanto aos direitos, é importante lembrar que, já que falamos de vida humana, devemos falar também de dignidade, e se há dignidade, há direitos humanos. Não podemos negar a dignidade a um nascituro, que é um ser humano, baseando-se apenas na idade gestacional.

2 – Para estabelecer se um embrião é um cidadão, o Estado deve ser informado pela ciência sobre quando surgem no desenvolvimento os "tributos mais caracteristicamente humanos.
 
O autor, que é um "cientista", acha que cabe apenas à ciência determinar quem merece ou não a dignidade humana e o direito à vida. Este argumento é anacrônico e remonta à Grécia antiga, quando, após o nascimento, os "sábios" determinariam se o nascido era humano ou "monstro". Se o deixariam viver ou se o matariam, caso a criança fosse, por exemplo, mal formada. No mais, é interessante ressaltar que o argumento que afirma que a vida do indivíduo humano começa na concepção é científico, confirmado pela embriologia. O fato de os "atributos mais caracteristicamente humanos" não terem ainda se desenvolvido não faz com que a vida ali presente (e nem o próprio autor nega isto) não seja humana.
3 – Os atributos mais caracteristicamente humanos não são ter um rim funcionando, nem um coração batendo, mas ter um cérebro em atividade. Isto é razoavelmente estabelecido porque é a morte cerebral que é considerada o critério para dizer quando uma pessoa morreu, e não a morte de outros órgãos. Por isso mesmo transplante de coração não é acompanhado de "transplante" de registro de identidade.

4 – Se a morte do cérebro é o critério médico que o Estado aceita para considerar o indivíduo humano como morto, o início do cérebro deve ser logicamente e necessariamente o critério para considerar o início do indivíduo, e não a fecundação.



Postado no Bioética e Fé Cristã em 9/27/2016

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Na parábola do bom samaritano: a ética comunitária

O comunitarismo é uma filosofia política em que a ética médica, que se fundamentaria num comunitarismo moderado, aceita o pluralismo de concepções da vida boa e alguns direitos individuais. Procuramos destacar o sentido do comunitarismo liberal na parábola do Bom Samaritano. A experiência esplancnofânica determina no Samaritano um sentimento de bem comum.




Postado no Bioética e Fé Cristã em 9/15/2016

terça-feira, 30 de agosto de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Transgender Identification Ethics Statement : Perguntas que Demandam Respostas

Eduardo Ribeiro Mundim


Como cristão evangélico, membro de pleno direito de uma igreja protestante histórica, médico por vocação, na especialidade de endocrinologia e metabologia, subscrevo integralmente o Credo de Niceia, e estudo as Escrituras através da gramática e da história. Assim sendo, não posso deixar de apresentar críticas que considero pertinentes ao pronunciamento da Christian Medical & Dental Association (CMDA), "transgender identification ethics statement", publicado em 21/04/16 e disponível no endereço https://cmda.org/library/doclib/Transgender.pdf.
 
E as inicio questionando o apreço pelo entendimento histórico e duradouro de todos os ramos do cristianismo a respeito da sexualidade dual, homem e mulher.

Este mesmo entendimento histórico mantém a mulher alijada do sacerdócio na maioria das denominações protestantes históricas, além das denominações católica romana e ortodoxa. Levada às últimas consequências, o cristão que lhes nega esta posição de autoridade não deveria legitimar nenhuma mulher na esfera política em cargo executivo: da rainha da Inglaterra passando pela presidente Dilma até chegar na prefeita no município ao lado. Ou há base bíblica sólida para fazer separação entre a autoridade dentro da igreja e fora?

Este mesmo entendimento histórico levou a escravidão de seres humanos por outros seres humanos a durar mais que 1.500 anos após a ascensão do Senhor. Tanto nos arraiais protestantes quanto nos católicos.

Este mesmo entendimento histórico levou o racismo institucional e pessoal a perdurar até hoje, ainda que de forma velada e com tímidas manifestações das igrejas históricas.


artigo completo em www.bioeticaefecrista.med.br/textos/Transg_Ident_Ethics_Stat _resposta.pdf

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Postado no Bioética e Fé Cristã em 8/30/2016

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Transgender Identification Ethics Statement

CMDA affirms the historic and enduring Christian understanding of humankind as having been created male and female. CMDA has concerns about recent usage of the term "gender" to emphasize an identity other than one's biological sex, that is, a sense of self based on subjective feelings or desires of identifying more strongly with the opposite sex or with some combination of male and female.
CMDA affirms the obligation of Christian healthcare professionals to care for patients struggling with gender identity with sensitivity and compassion. CMDA holds that attempts to alter gender surgically or hormonally for psychological indications, however, are medically inappropriate, as they repudiate nature, are unsupported by the witness of Scripture, and are inconsistent with Christian thinking on gender in every prior age. Accordingly, CMDA opposes medical assistance with gender transition on the following grounds.
A. Biblical
  1. God created humanity as male and female (Genesis 1:27, 5:2; Matthew 19:4; Mark 10:6). God's directives – to have dominion over the earth and to fulfill his goals of procreation, union, fellowship, and worship – are given to men and women together (Genesis 1:26-28, 2:18-24).
  2. Men and women are morally and spiritually equal (Galatians 3:28) and are created to have roles that are in some respects alike and in other respects wonderfully complementary (Ephesians 5). (See CMDA statement on Human Sexuality)
  3. All people are loved by God (John 3:16-17). All struggle with moral failure and fall short of God's standards (Romans 3:10-12) and, therefore, need the forgiveness that God provides through Christ alone (John 3:36; Romans 3:22-24; Colossians 1:15-22; 1 Timothy 2:5-6).


leia o restante em http://bioeticaefecrista.blogspot.com/2016/08/transgender-identification-ethics.html



Postado no Bioética e Fé Cristã em 8/10/2016

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Transexual pede morte assistida se não puder mudar nome e gênero


A designer Neon Cunha, 44 anos, entrou no início deste ano com ação judicial de retificação de registro civil. Quer que seu nome de batismo, Neumir, e o sexo masculino, que lhe foi atribuído, sejam trocados. Ela se recusa a ser diagnosticada com disforia de gênero, condição descrita pela medicina como desconforto com o gênero que é atribuído ao nascer. À justiça, pede o "direito a uma morte assistida" caso seu pedido não seja atendido. 



Postado no Bioética e Fé Cristã em 8/04/2016

quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Procuradoria apura omissão do Estado nos serviços de aborto legal no Brasil

Uma jovem foi violentada e o estupro resultou numa gravidez. Nesse caso o aborto é legal no Brasil, e ela pode interromper a gravidez em um hospital habilitado a realizar o procedimento. 

Só que não há uma lista pública que mostre quais hospitais podem atendê-la. Assim, o caminho para a interrupção legal da gravidez é difícil –muitas vezes, não há orientação adequada no primeiro hospital procurado pela mulher. 

No Brasil, o aborto é legal quando há risco de morte para a mãe, se o feto é anencéfalo ou se a gravidez é decorrente de estupro. Apenas 71 hospitais no Brasil fazem o procedimento. Em 2014, 47.646 estupros foram registrados, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. São 23,5 casos a cada 100 mil habitantes. Em média, apenas 35% dos crimes sexuais são notificados, o que pode indicar um número maior. 

No início do mês, o Ministério Público Federal instaurou um inquérito civil para apurar a omissão do Estado em casos em que vítimas de violência sexual não receberam o atendimento médico adequado –lei de 2013 garante "o atendimento imediato, obrigatório em todos os hospitais integrantes da rede do SUS, de serviços de atendimento emergencial a vítimas de violência sexual". 



Postado no Bioética e Fé Cristã em 8/03/2016

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Bioethics, health, and inequality

Giovanni Berlinguer

Bioethics, a philosophical discipline that aims to connect science, life, and morality, has been focused almost exclusively on recent developments in biomedical sciences—on extreme cases that were, up to now, infeasible and sometimes almost inconceivable. This frontier bioethics concerns, for instance, organ transplantation, genetic therapy, cloning, use of stem cells, preimplantation diagnosis, and transgenic technologies, which lead to unheard-of events and new moral categories.

I uphold the existence of another area of bioethics, less remote from the experience of ordinary people. This type could be called everyday bioethics1 because it concerns the daily persistent conditions of most of the world's population, often difficult and sometimes tragic. If we consider common behaviours and knowledge, even among people who ignore the latest progresses of science, we can state that moral reflections on birth, gender relations, justice and autonomy, disease and health care, the interdependence of species, and death have a very long history—as long as that of humanity. These reflections guide today, wittingly or unwittingly, the decisions of all individuals, social groups, and communities, because "it must be shown that all men are 'philosophers', by defining the limits and characteristics of the 'spontaneous philosophy' which is proper to anybody".2

Both frontier and everyday areas of bioethics deserve equal attention and are closely inter-related. Their intersection could give rise to stimulating philosophical debates, to a better understanding of moral principles, and to coordinated actions. I would like to point out the practical and moral interests of these connections through three examples.


segunda-feira, 18 de julho de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] HIV, Prisioners and Human Wrights

Worldwide, a disproportionate burden of HIV, tuberculosis, and hepatitis is present among current and former prisoners. This problem results from laws, policies, and policing practices that unjustly and discriminatorily detain individuals and fail to ensure continuity of prevention, care, and treatment upon detention, throughout imprisonment, and upon release. These government actions, and the failure to ensure humane prison conditions, constitute violations of human rights to be free of discrimination and cruel and inhuman treatment, to due process of law, and to health. Although interventions to prevent and treat HIV, tuberculosis, hepatitis, and drug dependence have proven successful in prisons and are required by international law, they commonly are not available. Prison health services are often not governed by ministries responsible for national public health programmes, and prison officials are often unwilling to implement effective prevention measures such as needle exchange, condom distribution, and opioid substitution therapy in custodial settings, often based on mistaken ideas about their incompatibility with prison security. In nearly all countries, prisoners face stigma and social marginalisation upon release and frequently are unable to access health and social support services. Reforms in criminal law, policing practices, and justice systems to reduce imprisonment, reforms in the organisation and management of prisons and their health services, and greater investment of resources are needed.

quarta-feira, 13 de julho de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Uma palavra sobre a descriminilização do aborto de anencéfalos

  João Henrique R. Marçal 
 
Ao nos referirmos que vivemos em um país laico temos que ter em mente o que isso realmente significa. A Igreja, ou qualquer outra religião, seja ela, cristã ou não, não deve interferir nas questões políticas do Estado assim como o Estado também não interfere nos assuntos que diz respeito à religião. Uma lei não deve ter por base a questão religiosa o peso da influência religiosa não deve ser o que sustenta a criação de uma nova lei.
 
Se o país é laico isso significa que o povo tem liberdade de escolha religiosa e a religião não tem um peso fundamental nas decisões que, por exemplo, o STF (Supremo Tribunal Federal) venha decidir para o bom andamento do país. 
  No dia 12 de abril de 2012 foi aprovada, pelos Ministros do STF, em sua maioria, a descriminalização do aborto de fetos anencéfalos (sem cérebro).[1] Causando grande polêmica no meio de várias entidades religiosas que se posicionam contrárias a qualquer tipo de aborto. Por anencefalia devemos entender que consiste na ausência no feto dos dois hemisférios cerebrais. (PESSINI, BARCHIFONTAINE, 2000, pg 243)[2]. 
  Mas o que não é entendido aqui é que o STF está dando amparo legal para as mães que desejam interromper a gestação quando se encontrarem nesta situação. Não há a obrigatoriedade e sim a livre escolha da mãe de abortar ou não respeitando, assim, a autonomia da mulher.  A opinião da mãe é mais importante e esta tem que ser respeitada. A mulher que gesta uma criança anencéfala, tendo este amparo legal, evita ter que buscar uma autorização judicial, que poderia ser aceita ou não e também evita que ela viesse a recorrer, devido à sua condição, a abortos clandestinos. 
  A mulher gestante de um feto anencéfalo, realizando ou não o aborto, sofre grandes conseqüências emocionais, dizer que mulheres que abortam sofrem mais do que as que levam a gestação até o fim é muito subjetivo já que não há critérios empíricos para diferenciar um ou outro tipo de sofrimento. 
  Usar também de argumentos religiosos para negar a prática de aborto, nestas situações, principalmente argumentos levantados pela igreja cristã, seja ela católica ou protestante, ou quaisquer outras ramificações religiosas, não é determinante para que o STF tome suas decisões pelos seguintes motivos:
 


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Postado no Bioética e Fé Cristã em 7/13/2016

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Anencefalia e transplante de órgãos

Resumo: O transplante de órgãos em neonatos anencéfalos apresenta-se como um conflito ético. Os neonatos portadores de anencefalia são, sob o critério de morte encefálica adotado no artigo 3º da Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, considerados pessoas vivas, uma vez que morte encefálica implica a falência, inclusive, do tronco encefálico, o que não ocorre no caso do anencéfalo. Entretanto, a Resolução nº 1.752/04, do Conselho Federal de Medicina (CFM), estabelece a permissão para o médico realizar o transplante de órgãos ou tecidos do anencéfalo, após seu nascimento. A adoção de tal medida pelo CFM implica a morte do neonato anencéfalo praticada pelo médico, uma vez que o mesmo se encontra vivo, conforme os parâmetros legais apontados. O dilema se instaura em razão de posicionamentos éticos distintos. O CFM consolidou o entendimento daqueles que entendem serem inaplicáveis e desnecessários os critérios de morte encefálica ao neonato nessas condições, visando à realização de transplante de órgãos, ou seja, postura nitidamente utilitarista. O presente texto defende o respeito à pessoa enquanto eixo axiológico central de toda discussão bioética. 

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Eutanásia: Diretora do Instituto de Bioética da Bélgica alerta para «lei que se tornou incontrolável»

Lisboa, 01 jul 2016 (Eclesia) – A Plataforma "Pensar e Debater" promoveu esta quinta-feira no Estoril um debate sobre a eutanásia, trazendo a Portugal oradores de França, onde a prática ainda não foi legalizada, e da Bélgica, onde ela já está em vigor há 14 anos.

Em entrevista à Agência ECCLESIA, Carine Brochier, diretora do Instituto Europeu de Bioética – Bélgica, abordou o impacto da aprovação da lei da eutanásia naquele país, desde 2002.

Segundo esta especialista, o número de casos de eutanásia naquela nação tem "subido ano após ano", passando de 24 em 2002 para 2021 casos em 2015.
Refira-se que a Bélgica é o único país onde a eutanásia pode ser praticada sem limite de idade, ao contrário por exemplo da Holanda, onde a idade mínima é de 12 anos.

Para Carine Brochier, "o mais preocupante é que esta lei se tornou incontrolável".

"A intenção dos legisladores era ter controlo, existirem medidas de segurança que acabassem com a eutanásia clandestina, mas 14 anos depois posso assegurar que não é isso que se passa", frisou a especialista, que aconselhou Portugal a ponderar muito bem a sua decisão.

"Uma vez aberta a porta à eutanásia, ela será incontrolável" e para além disso a lei "não acabou com a clandestinidade, temos ainda muitas práticas que não são regulamentadas de forma oficial", apontou a mesma responsável, que considera que a aprovação da lei da eutanásia poderá ameaçar "todo o tecido social".
"Nós vemos isso aqui na Bélgica mas também na Holanda", salientou Carine Brochier, lamentando que cada vez mais pessoas recorram também à eutanásia devido a depressões ou outro tipo de problemas psicológicos.

Este responsável sublinhou a importância de "olhar para a questão não apenas sob o prisma redutor da eutanásia, mas como um todo, porque se trata de uma matéria de grande complexidade" e que envolve muitas pessoas, desde os doentes aos cuidadores, passando pelos familiares e amigos.

Para Tugdual Derville, o que está em causa é se a sociedade atual quer "ter uma cultura onde as pessoas mais frágeis sejam vistas como um bem a proteger, onde tenham lugar, mesmo as mais dependentes", ou uma cultura dominada pela "exclusão" e pelo "utilitarismo".

Em França a lei da eutanásia ainda não foi aprovada, mas este ano a assembleia nacional francesa votou favoravelmente uma legislação sobre sedação paliativa.

Enquanto vice-presidente da Associação Alliance Vita, Tugdual Derville tem contactado com muitos casos de pessoas a necessitarem de apoio e de cuidados no final da vida, e destaca a necessidade de "colocar os mais frágeis no coração da sociedade".

"Somos pelos cuidados contra a dor, pelos cuidados paliativos, mas sem caírem no pecado da morte", aponta aquele responsável, para quem Portugal terá também de chegar a "uma definição clara de eutanásia".

Isabel Teixeira da Mota, uma das fundadoras da plataforma "Pensar e Debater", responsável por este debate, destacou a oportunidade de refletir acerca da eutanásia a partir de pessoas já com experiência neste campo e defendeu a necessidade de "alargar o debate a todas as perspetivas de vida".

"Estamos a falar muito da eutanásia, talvez vendo os aspetos mais negativos, que implicam a dor no final de vida. Se virmos também a forma como os cuidados paliativos podem ser implementados, como a visão dos familiares, de toda a sociedade, dos políticos, dos cuidadores, pode ser organizada, talvez isso alargue os horizontes do debate", considerou.

CB/JCP

fonte: http://www.agencia.ecclesia.pt/noticias/nacional/eutanasia-diretora-do-instituto-de-bioetica-da-belgica-alerta-para-lei-que-se-tornou-incontrolavel/



Postado no Bioética e Fé Cristã em 7/01/2016

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] Aborto de Anencéfalos: A presença velada do totalitarismo

Além dos pressupostos teológicos, lógicos e epistêmicos implicados em boa parte das discussões sobre a liberação do aborto no caso de anencéfalos, há também pressupostos políticos e jurídicos que, no caso em questão, são determinantes, sobretudo, nas propostas de solução. Ora, diante disso, a pergunta que se impõe é: com base em quais pressupostos políticos e jurídicos o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ultrapassar os limites de sua competência e reformar o Código Penal? E mais!

Se não cabe ao STF decidir que tempo de vida pós-nascimento justifica ou não a morte do feto, por que, então, o STF decidiu legalizar a interrupção da gravidez de fetos sem cérebro? Sempre me pergunto como devemos designar atos políticos ou jurídicos que, partindo de ideologias subjacentes, mudam arbitrariamente a letra da lei em nome de uma lei superior não positiva. Note que não se trata de uma arbitrariedade ditatorial, despótica ou tirânica, visto que tal arbitrariedade se autolegitima na própria reformulação da lei. Talvez a melhor designação para esse tipo de ato seja aquela oferecida pela filósofa judia alemã Hannah Arendt (1906-1975), a saber, o totalitarismo.



Postado no Bioética e Fé Cristã em 6/29/2016

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Fwd: [Bioética e Fé Cristã] A ética protestante no pensamento de João Calvino

Ivan Santos Ruppell Jr

Resumo:

Lançado no início do século 20, o livro A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo tornou-se obra clássica da Sociologia da Religião, ao desenvolver método de análise social em percebendo a influência da religião na estrutura da sociedade. Tendo por objeto textos oriundos de grupos Reformados Calvinistas dos séculos 17 e 18, o sociólogo Max Weber extraiu elementos da doutrina puritana calvinista que propiciaram uma conduta aos cristãos em meio à sociedade econômica, gerando assim um novo tipo de capitalismo – o capitalismo moderno ocidental. João Calvino é um dos principais líderes da Reforma Protestante do século 16, época em que legou à Igreja Cristã e ao mundo, reconhecida obra de Teologia sistemática Protestante, que se tornou base de doutrina às Igrejas Reformadas. Nesta dissertação, buscamos apreciar a análise de Max Weber acerca da ética protestante que denominou espírito do capitalismo, bem como apreender dos escritos originais de Calvino no século 16, a proposta de conduta e elementos de doutrina que identificariam uma Ética Protestante original ao pensamento do reformador. O propósito é conhecer e resgatar o pensamento próprio a Calvino e assim as verdades e valores formadores de sua distinta ética cristã orientada à conduta do cristão em sociedade. 




Postado no Bioética e Fé Cristã em 6/27/2016

domingo, 19 de junho de 2016

O que a Igreja pode oferecer aos homossexuais?

Eduardo Ribeiro Mundim


Esta não é uma questão de simples resposta, nem fácil. E esta resposta não é a resposta que busco; ainda é um rascunho, imperfeita, incongruente, em alguns momentos até mesmo hipócrita. Sua única defesa é ser honesta: para com a interpretação que faço da leitura das Escrituras e para com a realidade que bate a minha porta.

A razão da pergunta

Homossexualidade foi encarada como uma atitude de profunda imoralidade e rebelião contra Deus. No ocidente, é bem provável que a cultura judaico-cristã1 seja um dos responsáveis por esta visão. A pessoa que se definia como homossexual era vista, necessariamente, como moralmente má em sua natureza, de forma diferente das demais pessoas. Frequentemente a homossexualidade carrega a pecha, não dita diretamente mas claramente percebida nas entrelinhas, de “pecado imperdoável”.

Muito colaborou, nos últimos anos, para esta visão, o movimento político homossexual quando buscou, pela via legal, impor sua visão de normalidade a todos os aspectos da vida, privada e social, incluindo a criminalização de textos, laicos ou considerados sagrados por religiões estabelecidas, discordantes.

É justo reconhecer que este movimento político é o fruto extremado da crueldade com que os homossexuais foram tratados ao longo da história, seja pela sociedade civil, governo, diversas religiões, e cristãos de diversas denominações2. É justo reconhecer que, enquanto Igreja, pecamos em diversos momentos contra estas pessoas, protegidos de sentimento de culpa por supostas boas intenções e “amor ao pecador, mas odiar o pecado”.

À parte desta movimentação política, conhecemos cristãos sinceros, em tudo semelhantes a nós mesmos, indistinguíveis em suas atitudes, discursos e manifestação de fé autêntica, que assumem, por livre decisão, serem homossexuais. A única diferença que passa a existir entre “eles e eu”, entre “eles e nós”.

Esta descoberta choca por chacoalhar todo um entendimento sobre o assunto. Entendimento este que deve ser escrutinado em busca de preconceitos infundados, preocupação com a ortodoxia com o sacrifício da pessoa e completa harmonização com toda a revelação contida nas Escrituras.

A pergunta insistente é: pode um homossexual ser verdadeiramente um cristão e permanecer homossexual? Quem são estas pessoas a quem chamamos irmãos(ãs) supondo serem heterossexuais e que tememos chamar irmãos(ãs) ao sabê-lo(a)s homossexuais?


O que torna esta questão diferente

Deus, enquanto Criador, tinha um propósito para sua criação, desvirtuado pelo pecado. Desde então, todas as nossas esferas de vida estão imersas em uma dupla condição: mantendo a intenção original do Criador, mas alterada pelo nosso pecado. E isto inclui a sexualidade.

Até o presente momento, sou obrigado a concordar com a expressão “é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que encontrar respaldo bíblico para o homossexualismo”3.

Sendo assim, a homossexualidade não está de acordo com o planejado pelo Criador, mas é uma realidade. E sexualidade é uma característica intrinsecamente humana, que nos define ao longo de nossa vida, organiza nossos relacionamentos interpessoais e marca, de forma consciente e inconsciente, nossa estrutura psíquica.

Aceito como verdadeira a afirmativa de que homossexualidade não é uma questão de escolha consciente: ela acontece. Aceito-a porque, até onde seja do meu conhecimento, ninguém provou o contrário. Muito antes, as explicações sobre a hetero e homossexualidade passam por mecanismos subliminares e inconscientes.

E na definição da sexualidade (ou seria genitalidade?) existe uma exceção4 que me paralisa e faz perguntar se as coisas são tão simples como alguns querem fazer crer. Existe um grupo de pessoas, afetadas por diversas alterações nos seus organismos, que não apresentam o sexo genético igual ao corpóreo. Como exemplo, são geneticamente homens (os cromossomos sexuais são XY) mas externamente são mulheres como todas as outras. Frequentemente esta condição é descoberta a partir da adolescência, podendo não sê-lo até a pessoa afetada procurar explicação na sua dificuldade em engravidar. Seria este um casamento homossexual (pois teríamos um homem na aparência e na genética casado com outro homem genético mas de aparência e criação e atitudes e psiquismo e... feminino).

Não estou procurando a proteção da exceção – mas se este casal fosse membro de nossa igreja, como aconselhá-lo se eles fizessem esta pergunta???

Estou usando este exemplo para dizer que a definição da sexualidade é algo muito mais complicado do que pensamos. Que há situações, como esta, não previstas, até prova em contrário, nas Sagradas Escrituras.

Passo para outro exemplo que me incomoda. Obesidade é um problema de saúde pública e é resultado, única e exclusivamente, de uma ingesta calórica superior ao gasto. Quantos obesos que conhecemos que simplesmente não conseguem reduzir e balancear a equação (incluindo alguns que foram operados e não deram certo)? Mas alimentação é outro aspecto de nossas vidas conscientes marcadas por eventos subliminares, culturais e inconscientes5.

A realidade que me bate à porta é que, ainda que haja diversas pessoas “ex-homossexuais”6, talvez esta não seja a regra, da mesma forma como não é possível a todos os obesos se tornarem “ex-obesos”.


As bases da proposta

O chamado do Evangelho é para que aceitemos o perdão dado pela morte de Cristo na cruz e a nova vida, agora e na eternidade, garantidas pela Sua ressurreição. A segunda parte é consequência da primeira, e não o contrário.

A convicção do pecado é algo pessoal e intransferível, assim como a certeza do Seu perdão. Cada pessoa tem sua própria história, consciente e inconsciente, e esta vai definir os pecados ocorridos, sejam acidentais, sejam voluntários.

A santificação é mandamento (Hb 12.14), é para ser buscada voluntária e ativamente(II Co 7.1), sob a direção do Espírito Santo, através de uma vida devocional individual e comunitária. A agenda de santificação de cada cristão é ditada pelo Espírito Santo tendo como base sua história pessoal.

Atitudes corretas não refletem,necessariamente, coração correto, como nos ensina o Sermão da Montanha em diversos momentos.

E cada um de nós sabe as lutas que tem com suas dificuldades pessoais, que se apresentam continuamente como um pecado à nossa frente, como diz Davi: “o meu pecado está sempre diante de mim”.

Pouco provável a santificação 100% nesta vida – e somente posso crer nisto levando em conta a morada na Nova Jerusalém, não antes.


A proposta

1. a Igreja é um braço do Senhor Jesus no mundo, que a todos chama ao arrependimento, à conversão, à nova vida, sem distinção de nenhuma espécie, a começar do “tamanho do pecado”. Raça, cor, sexo, religião, opção política, opção sexual, profissão, e qualquer outro critério de classificação ou divisão, não são excluídos da mensagem de amor. Portanto, a igreja deve estar aberta (e por que não deveria buscar ativamente?) aos modernos cobradores de impostos, as Madalenas contemporâneas (e não só as mais bem situadas financeiramente com roupas de grife e atendimento personalizado), aos atuais jovens ricos enamorados por si mesmos, aos indigentes vítimas do sistema iníquo, às boas pessoas que, apesar de boas, descobrem-se tremendamente pecadoras na presença dEle. E isto inclui os homossexuais masculinos e femininos, travestis, transgêneros e semelhantes.

2. as pessoas que, através de uma igreja local, têm um encontro pessoal com o Ressuscitado, devem encontrar nela todos os recursos necessários ao seu crescimento e amadurecimento na fé.

3. a sexualidade é uma questão sensível para todos, com forte conteúdo emocional inconsciente – e, portanto, perigoso. Os homoafetivos devem ser acolhidos com o mesmo amor com que são os heteroafetivos – qual a razão para a diferença? Estejam acompanhados ou não por parceiros (as). Por uma questão de integridade por parte da liderança da comunidade, as dificuldades inerentes à homoafetividade precisam ser, de modo terapêutico e cuidadoso, pontuadas. A questão ainda está em aberto, havendo dificuldades extras para os cristãos nesta situação. À medida que lhes for possível, o “amor reverso” também precisa ser exercido. Ou seja, em consideração à comunidade, procurar não escandalizá-la futilmente.

4. o cuidado pastoral por parte de todos, mas em especial dos pastores e demais oficiais da igreja local, deve ser ativamente buscado e situações constrangedoras através do púlpito ou doutras circunstâncias litúrgicas ou da escola bíblica dominical, evitadas. O que não deve ser entendido como censura prévia, mas como um lembrete para não cair na armadilha fácil de hierarquização de pecados e no farisaísmo.

5. pelas luzes teológicas e bíblicas até este momento, o ideal seria o não exercício da genitalidade7 - assim como para os heteroafetivos a relação sexual deveria ser restrita ao matrimônio. Contudo, não sendo esta a realidade de quem chega à igreja local, ou de quem já congregando entende ter encontrado o(a) parceiro(a) para dividir sua caminhada pessoal, por analogia o exercício da genitalidade deveria ser restrito à existência de um contrato de união estável na forma da lei, com a mesma solicitação de fidelidade mútua, exigida pelas Escrituras.

6. pelo princípio do “amor reverso”, o(a) irmão(ã) que aspira aos ofícios de oficiais da igreja local sendo homoafetivo deveria discutir, em amor, com os pastores e demais lideranças, seu chamado, e as implicações institucionais decorrentes – entre elas, a expectativa institucional da renúncia à genitalidade, até que ocorra (se ocorrer), alguma modificação.

7. deve ser amorosamente explícito que a homossexualidade enquanto ideologia não encontra guarida nem respaldo na igreja cristã, por não haver possibilidade de harmonização com os ensinos das Escrituras. Discussão de igualdade de direitos civis é absolutamente legítima, mas apoio às “paradas do orgulho gay” não.


1Vou me permitir separar cultura judaico-cristã de teologia cristã, e mesmo de fé cristã autêntica.
2Testemunho disponível, por exemplo, no vídeo em http://www.youtube.com/watch?v=M9QHrtMLRWo
7Defendido pelo Caio Fábio, https://www.youtube.com/watch?v=Q-FWxg3v8cU

publicado a primeira vez em 12/08/12